19.12.06

Contos mínimos – 1

Em poucos minutos fiquei só e a estação ficou deserta. Ouço as badaladas na torre da igreja, dezoito horas; Ave Maria. Como procissão o trem que a leva, desaparece no horizonte, já não ouço o atrito entre os ferros, a fumaça no infinito onde os trilhos se juntam, evapora selando uma separação irremediável, sem volta. Dos sonhos que sonhamos, resta apenas, o rastro do amor e de uma paixão bloqueada.
Uma sombra mórbida surge na minha mente, talvez, essa seja a única expectativa do meu futuro. O tempo poderá apagar alguns momentos, mas não o brilho daqueles olhos, olhando os meus. Revirando as pastas de velhos projetos perdidos na memória, só vejo um possível desfecho, única solução: o divórcio natural com ausência de vida. Não conheço outro itinerário, e sem essa morte não terei vida.

Fica apenas a certeza absoluta, de que quando aquela vida cessar, voltarei à estação. O trem que se foi levando-a do meu mundo poderá trazê-la de volta, agora livre, essa mulher, que é o único motivo da minha felicidade e do meu viver. Estarei à espera, em ladainhas, refazendo os nossos sonhos de amor e de paixão, antes que a fome insaciável de possuí-la, me devore... Ave Maria.

1017 - 30-01-2006 Ventura Picasso

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