17.1.07




ENTRELINHAS
Bate Forte
Folha da Região


Moro num kibutz, habitação coletiva. Não é uma cooperativa israelense, é quebra-galho nacional. Planejava uma crônica, “O caixa três”. Coisa de candidatos que compram, e não pagam, eleitos ou não, caloteiros. A vizinha do nº. 32 invadiu minha sala, eu de cueca e ela apavorada, aos gritos:
- Meu filho meteu um pregão no pé, por favor, preciso de um médico.

Entrou no Fusca com o cabeçudo enrolado numa toalha.
- Não vou sujar o carro. Sabe onde é?
- Claro que sei.
Fomos ao plantão: eu, a vizinha e o pimpolho no prego. Mas, o caminho não fluía, vira pra cá, pra lá e nada. Ela foi logo solando:
- Não seja teimoso, pare ali e pergunte pro japonês.

O lugar não é estranho, ninguém ligou, há um bando de barrigudinhos, esse moquiço é o Bate Forte!
- Vai logo, diz a mãe aflita.
Entrei no boteco, o tempo parou. Todos em silêncio me encarando. Estático, eu não perguntava e eles não respondiam, até que surgiu um senhor, posso dizer elegante, sendo entrevistado pelo repórter Totonho Caracol; Pede licença, levanta-se e vem.

Passando as duas mãos nas laterais da cabeça, ajeitando os cabelos úmidos de gel, disse:

- Te conheço, Freud; Se és amigo do Consa, é nosso amigo, onde dói?
- Estou com uma criança acidentada e não encontro uma unidade de saúde por perto.

- Muito bem. Onde trabalho tem um pediatra fantástico, não há igual, atende quinze crianças em dez minutos. Urgência é com ele e, virando-se para o jornalista:
- Caracol, vou acompanhar o Freud.
Na calçada, deparando-se com o Fusca interplanetário, refugou:
- Vou com Bicho Grilo, você vem atrás.

Fila grande e na recepção, após toda burocracia indicaram o fim da fila.
- O fim da fila, chorando a mãe protestou.
O abelhudo trazia cravado um prego de vinte e cinco cm. Segurava o tornozelo para não tocar em nada. Não sangrava, não chorava e quem via aquela barbárie virava o rosto.

Surge no corredor, Nozão Dodói arrastando uma perna, raio-X na mão, desancada e com caspa no menisco, quando viu o pé do Manezinho, pimba: desmaiou.

O guri na fila e a desmaiada causaram um sururu danado. Pescoção daqui, pescoção dali, tinha gente querendo quebrar tudo. Por sorte, abrindo a porta de uma sala, o Dr. Duas Caras, que é psicanalista de boêmio gritou:
- Rodada de Benzetacil por conta da casa!
- Oba!!!

O pediatra fantástico chegou ao pé do moleque, de martelo e alicate; não deu um pio, prendeu o prego na pinça, martelou e liquidou.
- Cara bom, afirmou o Dr. DC. Em dez segundos acabou a arruaça. Não falei?
Alivio geral! Manezinho e sua mãe sossegaram. Esqueci o caixa três, os políticos caloteiros e comemorei com a galera a dose grátis. Acabou a bagunça e a unidade voltou ao normal.

Araçatuba, 20/01/2007


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