1.2.10



ASMA – A vida é um sopro
Ventura Picasso

Eram cinco irmãs para quatro camas, à noite, a caçula pegava carona na cama de quem estivesse de bom humor. Dormiam naquele quarto, em Los Angeles, sete ou oito pessoas, todos Williams.

O número sete é indivisível. O cabalístico sete, usado por políticos, religiosos e feiticeiros: O prefeito Cido Sério, em 2009, deu nota sete para seu governo. Quem elegeu os sete pecados capitais, Caboclo Sete Flechas e etc.? Gosto do Chanel n°5. E existe a outra banda: O sete da sorte, candidato com sete na cédula, enquanto que o n°13 dá azar. O treze é do Lula, azar da oposição. Alguns edifícios na América não contam o 13° andar.

Eu, que já passei por quase tudo na vida, não sou indivisível. À procura de socorro me divido. Entrei no Pronto Socorro, à procura de ajuda, em plena sexta-feira às 13h, pode crer que fria. Sexta é dia de Happy hour. E eu, como grávido, queria respirar pela minha parceira, quando ela dizia desesperada: ”Eu quero encher o pulmão de ar”!

O doutor Eduardo Jorge defendia os direitos do doente como uma das maiores conquistas dos movimentos populares. Entusiasmado falava em acolhimento, em humanização do atendimento ao paciente. Dizia ele: “O doente para ser atendido, não precisa de documento, precisa estar doente.”

Chegamos ao Pronto Socorro Municipal, após passarmos pelo HM e pela Santa Casa. Perguntei à recepcionista:
− Onde se faz inalação?
− No corredor, na primeira sala à esquerda.
Chegamos.
− O senhor faz inalação?
− Faço. Aguarde nessa fila.
Mostrou-me um lugar onde havia quatro pessoas à espera de atendimento. No lado oposto à sala que o enfermeiro atendia, havia certamente, seis inaladores desocupados.
− Ela está com falta de ar.
− Aguarde a sua vez.
Claro, fazer infiltração na bundinha de uma moça, sem duvida, para o atendente é mais importante. Mas, claro, notei que não havia protecionismo ou algum interesse imoral naquele procedimento. Havia incompetência das grossas. Mesmo por que, ele ainda atendeu uma menina e um senhor idoso, gastando ali, enchendo os tubos, esvaziando a seringa, mais umas três injeções. A minha parceira descoloriu-se.

Finalmente a nossa vez.
− Pois bem, o que a senhora está sentindo.
− Falta de ar, interferi, uma vez que a mulher já estava debilitada.
− Trouxe a receitinha?
− Revirando a bolsa encontrei uma “receitinha” de 26 de dezembro.
O enfermeiro, burocrata a esta altura, devidamente acomodado, isto por que, enfermeiro que se preza não senta, se acomoda como dizia o velho Jamelão, abrindo a receita olhou a assinatura do médico. A seguir conferiu a data da mesma. Bateu martelo baixando o veredito:
− Já estamos em janeiro, essa receita não serve, venceu. Você chega ali na frente, no atendimento, está cheio de médicos para refazer sua receita.
− Mas, ela está com falta de ar!
− E como eu vou prestar contas à chefia fazendo a inalação com essa receita?
Às pressas, voltamos à recepção para conseguir a tal receita. O Hall de espera do Pronto Socorro Municipal estava lotado.

Por sorte lembrei-me da UBS do Jardim Brasília. Já estávamos no palco, vivendo essa comédia, por mais de duas horas. Caminhando com certa dificuldade, chegamos ao estacionamento. Pegamos o Fusca, e com o spray Aerolin, mantinha alguns brônquios funcionando. Chegando à UBS o atendimento foi bem melhor. Mesmo assim, com todos os inaladores desocupados, passamos pelo burocrata.

À noite não dormi. Somatizei; a falta de ar estava em mim. Fui tolhido por um cansaço, que há muito não sentia. Na madrugada, Venus Williams contra Casey Dellacqua no Aberto da Austrália. Sempre fico admirado com as irmãs Williams e nessa noite, me passou pela cabeça, a bobagem da minha fobia. E se a Serena tivesse asma?
− Asma?

Um filósofo me explicou que é mais suave ao doente, a expressão bronquite. A palavra asma é agressiva. E eu entendi que bronquite é asma litgh. Por outro lado, um pneumologista tentou me explicar tecnicamente tudo direitinho, não entendi nada. Só sei que, quando o asmático está com falta de ar, na verdade está com excesso de ar. Os pulmões não conseguem expelir o ar contido em seu interior. E se o ar queimado não sai o novo, fresquinho, não entra. Parece mesmo porta de elevador, se um não sai o outro não entra. Aí, cara, é pronto socorro urgente!
− Urgente?

A estética do discurso do ‘acolhimento’ é romântico. Ninguém acredita. Talvez por isso, poucos funcionários da área da saúde o praticam. A vida se resume num sopro; Quando chegamos ou quando deixamos esse mundo, o primeiro e o último sopro. O ar que respiramos é vida, portanto, quem pode facilitar essa ação tem a obrigação de respeitar essa máxima. Dependemos de ar para viver!

Qualquer uma de nós poderia ter vencido, respirando aliviada, disse Williams após receber o troféu Daphne Akhurst Memorial Cup. Serena derrotou a belga Justine Henin neste sábado, 30/01/2010, conquistando o seu quinto título do Aberto da Austrália.
Ventura Picasso 01022010
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